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MARIA CÉLIA MARTIRANI é um jovem talento da literatura brasileira e italiana, porque seu livro para que as árvores não tombem de pé foi publicado em edição bilíngüe. É jovem como escritora por ter surgido recentemente, mas é jovem também como pessoa. É escritora que surgiu madura na técnica de narrar textos.Suas narrativas curtas, quer sob o formato de contos, ou de poemas em prosa, ou de outros gêneros, preenchem o vazio que eu sentia no atual panorama da nossa cidade. Eles tanto podem ser dramáticos, líricos, ou sob outras vestimentas, todas elas inovadoras, realizam-se plenos de uma intensidade narrativa alucinante que arrebata o leitor ou o estudioso de boa literatura. Isso a autora consegue pela estrutura, pelo estilo, enfim pela linguagem, que é a sua matéria prima. Assim, Maria Célia Martirani completa-se ao narrar e completa o leitor ao ler os seus textos. Sua literatura cumpre a função de comunicar, a de instruir e a de deleitar e enlevar. São textos de uma grande literatura e de uma grande autora. Para exemplificar a narrativa curta de Maria Célia Martirani, selecionei por critério estritamente pessoal, o texto dessacralização. Mesmo sabendo que o critério pessoal nem sempre seja o melhor pela subjetividade que encerra, penso, porém, que no caso de para que as árvores não tombem de pé todo texto selecionado seria uma ótima escolha.
dessacralização
Despreocupados e livres, caminhavam, matutinos, as calçadas de qualquer domingo. Uma alegria bêbada, não de quem bebeu muito, mas se embriagou demais com a simples presença de um na vida do outro. Que não era simples, mas era o bastante, eles que só assim se bastavam, puros de ar, água e sol... Falavam e riam, em risos falados mansos, fadados que estavam apenas àquela miúda felicidade... Os passos dele largos, os dela curtos, ela que tentava a todo custo o acompanhar... Daí, a igreja... Entraram pela lateral... Entraram só por entrar... Não, não que quisessem assistir missa, melhor a igreja assim vazia, só os dois, só um pouquinho, só agradecer... Que será que agradeciam? A mão dele envolvendo toda a frágil mãozinha dela, ela que de tão pequena, quase nem batia na altura do ombro dele ... Ele, que de tão alto, baixava generoso olhar pra encontrar o dela... Ajoelharam e apenas se deixaram ver por alguma imagem, algum santo, algum anjo voando solto no redondo da alta cúpula-vitral de luz. E foi com essa espécie de sabe-se lá que luz, que de lá logo saíram agora enlaçados, nos novos laços de fita de alguma esperança... Daí, virou o tempo... E eles estavam desprevenidos, desprevenidos que eram. E a garoa fina os apanhou de leve, no início, engrossando aos poucos, as gotas plenas, prenhes de águas de tanto céu... Molharam-se, mas mesmo assim, ele se lembrou de não deixá-la molhar. Tirou o casaco e o colocou na cabeça dela, com um beijo, com a ternura de quem cobre uma criança, um passarinho, uma pétala, um coração... E ela virou, de repente, quase santinha, com aquela espécie de manto-casaco, como se alguma das santas de verdade lá da igreja, cansadas da mesma imóvel e triste pose de sempre, resolvesse num rompante, descer do altar e, de braços dados com um gentil namorado, viesse dançar, na garoa da cidade, uma molhada e humana valsa...
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8 comentários:
Extremamente lírico, sensível!
A autora é curitibana? E, mais importante: qual editora publicou? Os leitores querem saber, pra poder comprar!
Oi, Raquel, de fato não constaram as informações solicitadas por você. Vou providenciá-las e postá-las.
Obrigado pela colaboração.
Maria Célia Martirani - o nome que emprega em suas publicações - é curitibana, professora de Língua Italiana e possui outras publicações: Recontando, contos, pela EDICON, 1993.
Para que as árvores não tombem de pé - Affinché gli alberi non cadano in piedi, como se observa é uma edição bilingüe, português e italiano, publicado pela Tavessa Editora, 2008.
Olá,Raquel, muito obrigada por sua apreciação, sobre meu conto!
Na verdade, nasci em São Paulo- SP e estou em Curitiba, desde 1989. A Araucária já criou raízes em mim, bem como - parafraseando Leminsky -"certos dias azuis, em Curitiba, mas tão azuis, que certamente, Helena Kolody acordou cedo e olha por todos nós..."
Meu livro:Para que as árvores não tombem de pé/ Affinché gli alberi non cadano in piedi, acaba de ser publicado pela Travessa dos Editores e estará, em breve, à venda nas livrarias da cidade e, também na Livaria da Vila e Cultura em São Paulo, além de ser vendido pela Internet, no: www.travessadoseditores.com.br
Tanto cara sorela Celinha...
Realmente, ler as páginas deste livro-poema, me deixa num estado de gratidão e enlevo, diante de tanta sutileza e sensibilidade, que os "girassois" vivos despertariam numa nova primavera na tela de nossa tragetória...
Abraços com afeto , de marisa
Olá, Maria Célia. Dei uma espiada inicial no seu livro. A edição está caprichada, e o texto exposto neste blog me impressionou. Desejo uma bela trajetória - aqui e na Itália, se possível. E vou lendo os textos, aos pouquinhos.
Impossível não se emocionar com este livro..é de uma sensibilidade...
Parabéns
Roberta Wasem
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