quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

A BUSCA DA FELICIDADE

Nos dados disponíveis, é possível perceber a alternância entre as relações de poder e solidariedade, nas tentativas de marcação das dis-tâncias psicossociais, situacionais, interacionais etc., ou de restabele¬cimento da simetria comunicativa, por meio da utilização do registro (...) Como se sabe, é bastante fácil identificar o exercício do poder de um interlocutor sobre outro, com base na identi¬ficação de estratégias de controle de tópicos e turnos na conversa. As relações de solidariedade, porém, igualmente perceptíveis no discurso, podem camuflar uma definição precisa da distância social, psicológi-ca, econômica, linguística, interacional ou simplesmente cognitiva.
Pode-se afirmar que a assimetria comunicativa resulta, pois, do exercício do poder pessoal, social ou institucional, embora, algumas vezes, seja apenas fruto de pressupostos acerca dos interlocutores, de julgamentos subjetivos dos falantes a propósito dos receptores das mensagens.
(MARTINS, Denise de Aragão Costa. Pressupostos ideológicos na interação: o mecanismo da simplificação comunicativa em ação, em (Org.) MAGALHÃES, Izabel. As múltiplas faces da linguagem. Brasília: UNB, 1996, p. 53.)
30 LONGO PERCURSO NA BUSCA DA FELICIDADE
Esta é a história de uma mulher que buscava incessantemente a felicidade. Onde encontrá-la quando ao certo nem sabia o que realmente buscava, o que realmente desejava? Será que o que procurava era algo necessário ou alguma mera complementação para ela, como pessoa física e psicológica? O jeito era mesmo sair à procura. Foi o que fez. Procurou os mais diversos profissionais e pessoas que poderiam vir a ajudá-la. E um a um foi consultando sobre o remédio para o seu mal.
1 Publicitário:
O que faz você feliz? É o último lançamento da moda primavera-verão mostrada no desfile que aconteceu sábado no shopping? Ah, não! Então, é aquele carro modernoso, potente, de cores extravagantes, que desfila pelas ruas da cidade? Não ainda? Então, aquele produto de beleza capaz de fazê-la bonita, para que possa vestir aquele biquíni último tipo? Se não for tudo isso, você terá de reinventar-se.
Deverá manter um contato pessoal com alguém da área, um profissional que entenda de técnicas modernas de atendimento, de auto-estima, e que possua visão de negócios e, ainda, que seja capaz de lhe vender uma ideia. Portanto, alguém que tenha potencial. Esse profissional da publicidade deve possuir um grande e atualizado portfolio, e ainda capaz de dar o key insight. Só assim ele poderá integrar o offline com o online. É isso que, com embasamento em pesquisa junto à mídia criativa, eu poderia indicar-lhe.
Poderia também indicar-me a mim próprio como pretendente a dar-lhe ajuda e uma solução definitiva para esse seu inconformismo diante daquilo que não tem.
- A mulher:Como não me parece que seja essa a solução para o meu caso, vou procurar outro profissional.
2- Economista: Minha senhora, na atual crise de confiança do mercado, nada se pode prever. Não se pode ainda saber o tamanho da atual crise. Ela poderá durar seis meses ou seis anos, tudo depende dos ativos das ações e dos derivativos dos juros. A bolsa, como se sabe, não tem dado trégua a ninguém, e mesmo o Brasil já está profundamente afetado, embora o nosso governante máximo diga que nada sabe de crise e que aqui se ela chegar será uma marolinha, que não vai dar nem para surfar nela!
Que bom que fosse assim realmente, senhora. Mas se vê que essa não é a realidade. Tudo está muito volátil e o que a senhora busca talvez não se encontre no mercado. E importar é difícil, porque com o dólar e o euro subindo a cada dia... Isso torna qualquer intercâmbio comercial caro e não compensador. A não ser que a Senhora queira dar tudo o que tem em forma de pagamento.
- A mulher:Está bem! Mas isso me soou como uma cantada! Está ele muito enganado. O meu negócio é a felicidade, não a vida fácil que muitas procuram. Sei, porém, que não será ele que dará uma resposta para o meu problema. Vou procurar ajuda na psicologia, já que não sou dada a crendices de cartomantes e madames que prometem em folhetos nos devolverem tudo o que perdemos. No máximo, aceitarei conselhos de algum guru, um bruxo, que seja realmente famoso e confiável.
3- Médico: Sabe... A vida é como aquelas lesões que no processo cicatricional sempre demonstram incômodo. Há necessidade de que elas retomem ao processo inicial para descobrir-lhes a causa subjacente ao mal. É uma questão de anamnese demorada e que nem sempre apresenta resultados positivos.
A senhora está estressada! Não se preocupe, hoje em dia, isso é muito comum! O importante é detectar qual o principal problema que a aflige. É necessário descobrir se o seu problema é de ordem clínica, reumatológica, pneumológica, cardiológica, ou hematológica. Talvez, e, então, seria mais grave, seria um caso de trombostemia? Espero que não! É que, para cada caso, há que se pensar em um tratamento adequado, o que implica impostos, recibos, notas, vigilância sanitária, conselho regional, associações de classe, sindicatos e convênios. Ou o pagamento será em dinheiro? Nesse caso, é diretamente com a minha secretária, a não ser que deseje acertar pessoalmente comigo em meu outro escritório particular.
-A mulher:É, parece que estão mesmo a fim de me conquistar, mas não vai ser assim, não! Vou firme em frente, que não é de saúde corporal, física, ou de carência sexual a doença que me aflige.
4- Psicóloga:A senhora fez muito bem em procurar ajuda na ciência do Dr. Freud, que ultimamente anda em baixa, mas eu ainda prefiro este psicanalista a outros estudiosos da alma humana, como o alemão Jung, por exemplo, que foi apenas um de seus discípulos e só complicou com o conceito dos arquétipos. O francês Lacan, unindo a psicologia à linguística, também complicou a nossa ciência. Detectar os anseios pelo discurso não me parece muito convincente. Os mais modernos são mais confusos ainda, porque, geralmente, misturam todos e dessa salada nada de bom pode resultar.
Freud, não! Ele nos fala diretamente pela interpretação dos sonhos e dos nossos anseios mais íntimos. Estes resultam de nossos desejos sexuais reprimidos. Sempre que reprimimos algo em nós, isso comprime o nosso ego, e, então, o nosso eu se manifesta do modo mais avassalador possível. Temos que dar vazão aos nossos sentimentos, relaxar... Só assim essa pressão contida pode expandir-se, mas já sob nosso controle, porque esta é a solução mágica, controlar os nossos instintos.
Para isso, porém, temos de nos dar. Dar-nos a tudo, dar-nos a todos, dar-nos ao mundo. Só dando, livramo-nos de nossas tensões.
- A mulher:Olha, doutora, eu vim em busca de ajuda e não gostaria de somente sair dando por aí. Eu quero uma outra solução, talvez mais clássica, mais comedida que essa que a sua psicologia me oferece.
5- Advogado: Data vênia, a Senhora fez uma boa escolha em procurar um jurista, um profissional do direito. Estou às suas ordens e espero ser-lhe útil na petição que me fizer e no direito que dela provier. Sempre serei um defensor público a seu serviço e que a ajudará a procrastinar o seu mal até que se alcance um julgamento em definitivo, sobre o qual não caiba mais processo recursal.
Irei sempre defendê-la nas barras dos tribunais, quer na primeira ou na última instância, com sapiência e nunca com dolo, como muitos procuram infligir a seus clientes. Serei um fiel servidor do direito em sua defesa e em busca do que for de justiça. Mas isso com certeza sairá caro, porque costumo cobrar bem de minhas clientes. E se não me retribuem a contento, sei avançar sobre elas.
- A mulher:Acontece que não estou com nenhum processo judicial e nem tenho inimizade com alguém, a não ser com minha nora, mas isso é coisa de somenos e que sói acontecer a todas nós mulheres, mães de filhos casados com essas criaturas, as noras, nem sempre à altura de nossos filhos, os filhos que criamos com tanto amor e carinho!
6- Professor e pedagogo:
Olha, minha querida discípula, eu que me saio tão bem em explicações sobre os fenômenos físicos, biológicos e linguísticos do ser humano, sinto-me impotente diante da sua busca. O muito que eu já li e já pesquisei, a convivência com grandes sábios do magistério, nenhum deles soube me ajudar a explicar doença ou mal-estar tão arraigado como esse que a Senhora me apresenta.
Vou continuar a minha pesquisa e quando tiver alguma solução para o seu caso, que consiste em um verdadeiro teorema que necessita de um desenvolvimento e de uma solução matemático-linguística, então voltarei a me oferecer para ajudá-la. Quando puder contar com saberes mais sólidos nessa linha de pensamento retornarei do mesmo modo de sempre, o de procurar ser verdadeiro em tudo que exponho, porque esse é meu compromisso com a ciência e com a minha própria consciência.
Espero, porém, que, talvez, enquanto esse lapso de tempo decorrer, possa a minha discípula ter já encontrado o possível refrigério para o seu sofrimento.
Ah, sim, lembrei-me: posso recorrer a uma colega de magistério, uma pedagoga. Talvez ela com algumas de suas ponderações, que normalmente as chama de “colocações” e que, confesso, não gosto nada do termo, mas enfim que fique ela com suas “colocações”. São dela e não minhas. Portanto, que vá...
Veja, minha Senhora, a minha colega pedagoga afirmou que Piaget e Vigotski, principalmente, seriam a solução, porque, segundo ela, e aqui transcrevo suas palavras:
“A felicidade está no saber fazer fazendo, ou seja, muitas vezes, quando menos se espera, estamos à frente de um problema de difícil saída e não temos para ele uma solução digna de registro, mas sabemos que a ciência da Pedagogia está aí exatamente para solucionar problemas como esses que são frequentes em nossas vidas, principalmente quando se trata de trabalhar junto aos educandos no chão da escola.
Dessa maneira, como nos ensinou o grande mestre da pedagogia amorosa, a educação tem que ser feita com amor, com doação, com alma, sempre acreditando em uma utopia possível, num sonho que a qualquer momento pode se realizar.
Assim, a lição que se tira dessas sábias palavras é que a felicidade pode estar em qualquer lugar, mesmo nas coisas mais simples, até insignificantes, que estão ao nosso lado e que considerando do ponto de vista da ciência do ensinar e do aprender, porque o professor nem sempre só ensina, ele também aprende com o aluno, podendo-se dizer assim, como disse aquele grande escritor que anda pelos sertões, que de repente o mestre aprende e o aluno ensina. Essa é a verdadeira sabedoria, porque hoje o professor não é mais aquele que sabe, quem sabe é o aluno, e o professor muitas vezes vai aprendendo ao longo do exercício das funções na sala de aula, recanto sagrado do ensinar e do aprender, vivendo assim a verdadeira arte da pedagogia, a ciência que nos embasa e forma as nossas personalidades, porque somos feitos de cérebro, de espírito e de corpo, numa visão holística da existência. Já não se recorre às ciências estanques, departamentalizadas, agora o todo é uno, e o uno é o todo.
Viu, talvez você mesma esteja com a chave da solução do problema em suas próprias mãos e não esteja sabendo manejá-la na abertura da estrada da felicidade, que pode muito bem estar no bojo da pedagogia, ciência muitas vezes desprezada, por ter um discurso bastante técnico e especializado, necessário para o bom encaminhamento das sondagens, para o ministrar dos ensinamentos.
Pense bem nas palavras do mestre, que dizem que o importante para a formação da consciência e, logo, da própria felicidade, é a verdadeira escolarização, aquela da educação popular, que visa sempre o oprimido e o relegado da sociedade, que busca se encontrar na alfabetização dialética. O diálogo deve ser feito sempre com as pessoas simples, como um meio de integração no meio social democrático.
Assim, penso que somente a pedagogia da libertação poderá libertá-la para a verdadeira felicidade.
- A mulher:Agradeço a boa vontade do professor e de sua colega pedagoga. Estou tendo alguma dificuldade em entender exatamente a mensagem, mas sei que terei de continuar a minha busca. Talvez o caminho do Senhor me leve a algum lugar santo em que eu possa repousar das dores deste mundo.
7- Religioso: Filha, que bom que veio buscar em nossa casa, nesta igreja, que é também a casa do Senhor, o bálsamo para as suas dores, o unguento para suas mazelas tão próprias dos dias atormentados em que as pessoas se afastam muitas vezes dos ensinamentos de Deus e buscam outros caminhos que nunca levam a lugar algum. Quando levam, é para a angústia, porque tudo que se mostra maravilhoso é apenas ilusão diante da luz do ensinamento da verdade religiosa. Esta, sim, pode realmente levar ao caminho eterno, que é onde todos um dia devem encontrar a paz do corpo e da alma.
Eu mesmo gostaria de ser o seu condutor nessa caminhada pelas veredas do Senhor. Dê-me a mão e vamos seguir por onde nos levarem as nossas preces e, com certeza, veremos uma nova luz aparecer. Será a luz do entendimento, da paz, da comunhão entre os seres, dos homens e das mulheres, num só corpo, numa só vida.
Louvado seja Deus, nosso Senhor, e que assim seja, para sempre e para a glória de todos.
- A mulher:Obrigada, padre. Vou procurar voltar-me mais aos mistérios divinos. Se assim eu ainda não encontrar a solução para o meu mal terreno, poderei talvez encontrar, em outro plano, a salvação para a minha pobre alma, como prega a Santa Madre Igreja, a única e verdadeira. Penso, porém, que mesmo assim me faltará alguma coisa, a paz, a tranqüilidade terrena.
8- Filósofo:Muito bem-vinda à ciência do pensar. Veja, segundo vai dizer Platão, a Senhora vive os anseios da incompletude humana. Como sabe, a Senhora é apenas a sombra da pessoa, não é a própria pessoa, porque essa vive no etéreo junto a um ser eterno. Portanto, é normal que a Senhora esteja vivendo uma ideia, que, aliás, é um ente real, mas que existe em si e por si, constitui o mundo inteligível, separado e distinto do mundo sensível, que é o mundo do não-ser, da aparência, do fenômeno.
Aristóteles, o peripatético, aluno dissidente do mestre Platão, por sua vez, vai declarar que a vida é apenas imitação. A verdadeira pessoa humana, aquela completa e perfeita, é obra de um demiurgo, que tudo pode.
Aristóteles, assim, ao divergir do mestre Platão, irá estabelecer alguns argumentos, como o seguinte: se há ideias do positivo, deve, necessariamente, haver ideia para o negativo. Portanto, se há ideia da beleza, deve haver também ideia para a feiúra.
Assim, minha Senhora, com o ensinamento desses dois dos maiores filósofos que o mundo já conheceu, pode-se deduzir que a sua felicidade, que, no momento, encontra-se apenas no mundo das ideias, pode aflorar e vir um dia para o mundo do real, do sensível.
Assim, em tempo indeterminado, a Senhora poderá perceber pelos sentidos que a felicidade finalmente chegou. Então, talvez tenha encontrado o que busca, minha Senhora.
- A mulher:Obrigada, ilustre pensador, sábio filósofo por excelência, mas penso que a filosofia ainda se torna para mim algo um tanto intangível e pouco inteligível. Talvez que eu ainda vivencie um mundo abstrato, longe do concreto, e por isso penso que não conseguirei com os seus ensinamentos encontrar o caminho para a minha descoberta. Portanto, vou ainda continuar a minha busca, talvez nos agentes do sobrenatural, como gurus, videntes e bruxos, que eu disse inicialmente que neles eu só creria, se fossem eles famosos e reconhecidamente competentes. Há sempre que se tomar as devidas providências, porque são tantos os falsos gurus a ensinarem por toda parte.

9 – Guru:Senhora, novel discípula, pode acreditar nestas minhas sábias palavras, porque reveladas por espíritos superiores, tudo que a vida nos oferecerá no futuro é repetir o que fizemos ontem e hoje. Assim, pode-se chegar facilmente ao entendimento de que um dia sempre é diferente do outro, e cada um nos traz um ensinamento novo, uma nova bênção para o nosso espírito ávido das coisas sobrenaturais e sagradas.
A certeza é uma só: sempre estamos num processo de contínua mudança, em direção ao aperfeiçoamento do corpo e da alma. Assim, nunca podemos deixar que um dia seja a repetição do anterior, pois desse modo não se completaria o círculo do aperfeiçoamento humano e espiritual, que é o destino final de nossas vidas.
Será que no seu caso, minha discípula, a perda da felicidade não se deve a uma outra perda, a de um amor? Essa perda não teria sido causada por algo ou alguma pessoa que, talvez por inveja da sua felicidade, buscou atrapalhar a relação por meio de sortilégios, ou, então, de uma maneira esotérica e espiritual?
Nesse caso, minha Senhora e discípula, poderia retomar-se a felicidade assumindo-se uma postura de autoafirmação, de orgulho, de desprezo pelos fatos passados. Portanto, é olhar para frente, seguir os passos dos ensinamentos do seu guru, que a felicidade um dia retornará, para o gáudio seu e meu, pelo sucesso dos nossos ensinamentos.
- A mulher:Obrigada, meu guru, muito obrigada mesmo! Mas vou continuar por mais uma vez, essa, sim, será a última esperança, para que eu encontre alguém que realmente me devolva a ansiada felicidade. Vou em busca de um vate, um verdadeiro sonhador, um autêntico nefelibata, um poeta.
10- Poeta: Minha Senhora, donzela das donzelas, inspiradora e musa! O que eu, humilde poeta, posso oferecer é um pouco de poesia. A poesia refrigera, a poesia encanta e minora as dores da nossa alma. Recomendo que a senhora sonhe, sonhe e depois busque realizar aquele que foi o sonho mais lindo de sua vida...
Eu estarei sempre a seu lado, quer o céu esteja plúmbeo, quer estrelado, quer seja uma tarde nublada, com o astro-rei escondido, quer seja um dia radioso de primavera, com flores a exalar o seu perfume, e pássaros a cantarem o amor nos galhos das laranjeiras. Estarei sempre a ouvir estrelas para transmitir à Senhora um sendeiro luminoso que a transporte aos páramos celestes.
E a Senhora deve subir à altura das nuvens e, como uma verdadeira habitante dessas miragens, passar a habitar torres de marfim. Só assim encontrará a felicidade, que sempre sabe estar a seu lado, e o que faz encontrá-la é a fé na poesia, na palavra do poeta, que é um mago, um vate, um ser predestinado a trazer felicidade aos outros.
- A mulher:Agora, sim, poeta, eu encontrei o que buscava. A poesia trouxe para mim a felicidade. O vate, o profeta, o inspirado, é o único daqueles que procurei que realmente merece a minha recompensa. Foi ele que abriu o meu ser, atingiu meu coração e fez-me vibrar como pessoa e como anjo. Ao ouvi-lo, foi como se escutasse também sinos, címbalos, frautas, que soavam em meus ouvidos, tão doce era a sua melopeia.
Eu sou feliz. Eu pertenço a você, poeta. Eu me entrego de corpo e alma. Faça-me feliz para sempre. Só você me merece, só você me completa. Juntos, viveremos a perfeição da poesia e a mais completa felicidade.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

QUADROS DA MINHA VIDA

TEXTO DA APRESENTAÇÃO, DE MARIA MIRIAM CURI:
O texto de Jayme Ferreira Bueno é a autobiografia de um homem de cultura e de uma inteligência notável, tudo contado numa linguagem simples e envol¬vente. Nesta leitura, fiquei sabendo de sua infância, de seus familiares e de toda a sua trajetória, antes de nos conhecermos na faculdade.
O livro contém um relato minucioso de sua vida, lutas e conquistas, tudo com preciosas reflexões pessoais e narrações descritivas de inúmeros lugares por onde andou. Temos, em cada relato, verdadeira aula de História. São escritos que encer-ram importantes lições de vida, tanto na parte pessoal, como na profissional.
(Maria Míriam Martins Curi)

TEXTO DO PREFÁCIO, DE RAQUEL ILLESCAS BUENO:
Em Quadros da minha vida, o leitor se deparará com um texto sumarento, cheio de energia, matizado todo o tempo por grandes doses de saudade, algumas vezes no limite da melancolia. Por outro lado, o discorrer sobre "a vida inteira que podia ter sido e que não foi" (para citar Manuel Bandeira), uma tendência muito comum em textos de memórias, aparece muito raramente. O início do texto nos envolve rapidamente, e assim tomamos conhecimento da infância e da adolescência. Que campos épicos os da Fazenda Taquara, onde cavalgava uma mítica Maria Buena! Fortes, as figuras femininas pontuam vários momentos da narrativa.
Partilhar, compartilhar são quase lemas da vida desse homem, e essa atitude é injeção de ânimo sempre renovado para os que com ele convivem.
(Raquel Illescas Bueno)

TEXTO DA ORELHA DO LIVRO,DE ORLANDO BOGO:

Quadros de minha Vida, ensaio autobiográfico, nos traz um delicioso relato, repleto de emoção e humor da vida de um professor, confesso amante de aventuras turísticas, da boa literatura, da boa culinária nacional e estrangeira e, sobretudo, apaixonado pela causa da educação e do ensino.
/;Desde o início, o texto nos desvenda o caráter de alguém que não esquece sua origem pobre, que a revela com orgulho, orgulho da terra natal, orgulho dos pais, do povo da localidade, dos amigos. É notória a carga de nostalgia que percorre todo o relato.
(Orlando Bogo)

Aos leitores só falta ler o próprio livro.
Um abraço a todos.
Jayme

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

PROJETO SUJEITOS LEITORES

Cezar Tridapalli, um jovem escritor, mestre em Letras é o responsável pelo Projeto Sujeitos Leitores do Colégio Jesuíta Medianeira de Curitiba. Professores, jornalistas e alunos com experiência em leitura, quer como docentes, quer como somente leitores, depõem como se iniciaram no ato de ler e o que essa atividade exerceu neles influências.

Para conhecer o site/blog, é só clicar em: www.midiaeducacao.com.br

Para assistir à entrevista de Jayme Bueno: http://midiaeducacao.com.br/?p=8494

E para ver todos os que já foram entrevistados: http://www.youtube.com/user/midiaeducacao#g/c/B874A5C85513EACE

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

CEZAR TRIDAPALLI, NOVO ROMANCISTA

Nílton Cezar Tridapalli, nome oficial, mas, porém, conhecido na literatura por apenas Cezar Tridapalli, que adotou como uma espécie de pseudônimo, o que é bastante frequente na literatura. O cidadão Nílton Cezar é bastante jovem, nasceu em Curitiba, em 1974.
Lecionou Teoria da Literatura na PUCPR e atualmente exerce suas funções no Colégio Medianeira como um dos responsáveis por pensar a educação em suas múltiplas linguagens, das mais tradicionais às chamadas novas mídias no Colégio Jesuíta, um dos mais tradicionais de Curitiba.
Nilton Cezar Tridapalli recebeu o título de mestre pela Universidade Federal do Paraná, no ano de 2004, com a dissertação De luzes e de sombras: jogos barrocos em contos fantásticos.
Procurando-se material sobre o escritor Cezar Tridapalli se encontram informações, que, além de romancista, é um grande tradutor de obras teóricas sobre literatura, principalmente de obras da língua italiana para o português, como, por exemplo, o Fantástico, de Remo Ceserani.
Este livro explora uma região particular da literatura e da arte moderna: aquela imaginação perturbadora e fantástica. Seguindo as manifestações dessa modalidade, o autor faz emergir sua capacidade muito especial de colocar em xeque nossa forma de ver o mundo e, com isso, revelar momentos de perturbação, de alienação e de dilaceração da consciência.
Ultimamente, Cezar Tridapalli, publicou o romance Pequena biografia de desejos. Segundo a crítica esse é um romance que já nasceu maduro. Diz do livro André Tezza Consentino:
Romances de estreia, em geral, são aqueles que depois da maturidade o escritor se arrepende e recusa a paternidade. E esta é a primeira grande qualidade do romance de Cezar Tridapalli: é um livro maduro, envolvente, _ de um vigor narrativo que só encontramos em escritores com mais tempo de estrada. Mas as qualidades vão além. É um olhar singular sobre o Brasil, a partir de Curitiba, esta cidade que desde Dalton Trevisan soube construir uma escola literária muito peculiar, de distanciamento, racionalidade e um fino humor.
Nesta tradição, Pequena biografia de desejos apresenta tanto o Brasil privilegiado quanto o país de uma imensa maioria de trabalhadores anônimos, aqueles que dificilmente são protagonistas do imaginário da classe leitora brasileira.
Mas não se engane: não é um romance dedicado à pedagogia ou à defesa de bandeiras políticas - como toda grande literatura, o livro de Tridapalli aposta, como fio narrativo primordial, na investigação da condição humana, mais atemporal e mais livre de demonstrações de teses ou teorias.
Finalmente, é um livro escrito dentro da tradição literária contemporânea mais preocupada em saber contemporânea mais preocupada em saber contar uma boa história do que em revolucionar a linguagem (...)
O crítico encerra afirmando que a estréia de Cezar Tridapalli "não passará despercebida. Pequena biografia de desejos, com certeza, dará um novo rumo na literatura feita no Paraná".
Na quarta capa, a editora selecionou o seguinte trecho do livro:
De início, sonhava com um abraço, forte, quente e, enquanto durasse, infinito. Se conseguisse isso, veria depois o que fazer, conforme as vontades que lhe dessem. Jamais, no entanto, tomaria qualquer iniciativa. Algumas noites, passou a sonhar que ditava para Adele trechos de seu livro. Os caminhos longos do ônibus eram dedicados a imaginar cenas, às vezes cogitando-as possíveis, outras vezes dando livre arbítrio para a loucura. Lembrava quando criança, nas primeiras paixões, estar sempre salvando a menina de perigos mil. Ria, misturava tudo e a imaginação, enquanto estivesse mergulhado nela, já lhe saciava um pouco os desejos.
Tridapalli abre a narrativa com este início questionador, que muitos de nós, muitas vezes, fazemos. Para as quais, de modo geral, não temos resposta:
Algumas perguntas não ficam menos interessantes ou menos verdadeiras só porque se tornaram clichés: até onde vão os limites de um homem? Eis uma pergunta cliché. Mas os limites são elásticos e, assim como tém um coeficiente de flexibilidade grande, assim como podem se expandir muito além de seu ponto de repouso, também - e isso é uma pergunta - podem encolher, atrofiar e formar uma crosta inerte dentro da qual a expansão vai ter sempre um sinal de menos antes? A superfície, a membrana que limita - muito flexível, importante repetir -, pode ficar ressequida, como borracha velha. Desidério chegara ao seu limite? Eu, Desidério, ele também se perguntava, cheguei ao meu limite?

Essa pergunta que é um trunfo nas mãos de um bom romancista é aqui, no livro de Tridapalli, um recurso precioso que irá se desenrolar ao longo do romance. César soube explorar o recurso com grande maestria e assim conseguiu um efeito literário que poucos escritores com seguem.
Ao encerrar a narrativa, Cezar Tridapalli escreve: Minutos antes de adormecer e sonhar com a estátua de mármore e com o escritor do outro lado da vidraça, Desidério agarrara firme o bilhete em que pedia ao tio para procu¬rar Adele e levar a ela o caderno. Ela entenderia o significado daquilo tudo, ele tinha certeza disso, de que bastaria a ela digi¬tar seu romance, aproveitar para dar uma ou outra revisada nos aspectos formais da língua portuguesa, e quem sabe até - sem a presença censora do autor - promover uma ou outra mudança, mas nada essencial. Por tudo isso, estava sereno e as contrações do rosto não eram espelho fiel de seu espírito. Dormiria um pouco aflito, é verdade, mas sabedor de que a sorte estava lan-çada, bastando fazer Pauline e Gregório encontrarem seu pas¬sado perdido no outro caderno para, já à revelia de seu criador, viverem sua vida feliz. Por isso Desidério morreu sem dor. Por isso e também por ter tido uma boa noite de sono antes da via¬gem final. O sonho não o impediu de ter um sono reparador, que o fizesse descansar para morrer.
Foi melhor assim, que Desidério morresse pensando que bastariam corrigir pequenos detalhes para seu livro ficar pronto. Passara despercebido por ele, no entanto, um grande problema narrativo: na primeira parte, na descrição das angústias de Pauline, Desidério, fascinado pelo modo escorreito de Adele, resolvera experimentar vestir a pele da primeira pessoa, cuja narração era feita por Pauline. Já a pressa e a ansiedade para terminar a obra fizeram com que ele ignorasse o fato e escrevesse toda a última parte em terceira pessoa, assumindo o controle da vida do novo casal, que até agora estava lá, com os lábios unidos e já possíveis câimbras na boca. Ignorar muitas vezes diminui o sofrimento. Do eu ao eles, de mim ao outro em apenas uma mudança de caderno.
Vestir muitas peles e ser quem?
Não se pode dizer se Adele foi ou seria habilidosa na junção das partes. Uma metade ficou lá no apartamento de Santiago; Adele, por um respeito piedoso, não conseguia jogá-la fora, quem sabe até roubaria alguns trechos se acaso resolvesse mesmo escrever. A segunda metade ficou lá no criado-mudo de Macária, também inerte, em cima das agendas do condomínio e do registro de atas. Quem sabe o tio não resolvia devolver tudo e, por acidente, as duas partes se encontravam? Talvez fossem para o lixo e tivessem a sorte de ser encontradas em algum latão ou aterro comum - já se sabe que nos lixos se encontram grandes preciosidades - por um diletante catador de comida que, a exemplo de Desidério, nutrisse amor por livros. Os escritos precisavam deixar suas gavetas, precisavam ser lançados ao mar. Só assim poderiam, como duas taças que brindam ou duas garrafas de vinho que por acidente se tocam e fazem tim-tim, unir suas partes e consagrar a união necessária.
Assim se arrastam os desejos humanos, às vezes céleres, sorridentes e fagueiros como crianças no campo ou propagandas de margarina, às vezes entrevados, cujos movimentos únicos parecem ser fasciculações involuntárias. De uma forma ou de outra, compreendidos todos os matizes possíveis nesse entremeio, estão sempre morrendo sem se terem satisfeitos.
Dois dias de velório são demais, há perigos constrangedores. Também apenas algumas horas seguidas de um enterro súbito podem dar o que falar por entre a vizinhança futriqueira. Assim, Cevício fez todos zelarem pelos prazos de um velório respeitoso, tempo suficiente para as orações subirem aos céus antes de Desidério e prepararem o caminho da alma, adulando os santos e dizendo que quem vinha lá debaixo fora sempre um bom homem, merecedor de todos os créditos celestes, incapaz de fazer mal à mais minúscula das criaturas divinas.
O tempo passará, o hall de entrada do edifício ganhará mais luz e a guarita será toda reformada, aumentando um pouco o espaço interno. Os porteiros velhos agradecerão ao novo, que chegou reivindicando melhorias com uma retórica de dar inveja a qualquer bom falastrão.
Quinze pessoas compuseram o cortejo. Ainda durante as últimas colheradas de cimento, todos já começaram a se afastar, esboçando a volta para a vida. Desidério foi quem ficou para trás, estendido em cima do jazigo do pai. Lá, os dois terão a eternidade para resguardar a imobilidade de seus corpos e o silêncio de suas palavras.

As marcas de uma literatura contemporânea, como apontou o crítico, percorrem a obra toda. Pelos fragmentos já se pode notar uma tendência pela autoficção, ou, então, por uma metaliteratura, tudo no caminho do Pós-Modernismo, o que fortalece e enriquece a obra de Cezar Tridapalli.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

GALERIA DOS NOVOS ESCRITORES - Maria Célia Martirani

Maria Célia Martirani Bernardi Fantin nasceu em São Paulo, em 1959. Foi aí, quando estudante do Colégio Dante Alighieri, que começou a interessar-se pela língua italiana. Formou-se em Direito pela USP. Em seguida, mudou-se para Santa Catarina, onde permaneceu sete anos. Foi um tempo e um espaço que lhe conferiram muitas vivências que hoje apresenta em seus textos.
A autora atualmente reside em Curitiba, onde, além do exercício do magistério, inclusive na Universidade Federal do Paraná, leciona a língua e a literatura italianas. Ao lado dessas atividades profissionais, Maria Célia nunca deixa de lado o ofício de escrever. É já uma escritora consagrada nos meios literários da capital paranaense. Tem dois livros publicados: Recontando, de 1993, e Para que as árvores não tombem de pé-Affinché gli alberi non cadano in piedi, publicado, portanto,em edição bilíngue, português e italiano, em 2008.
Maria Célia Martirani publicou ainda na Revista de Literatura e arte etcetera, número 9, da Travessa dos Editores (2006), a “Entrevista com Alessandro Baricco: à procura do velho narrador que habita em cada um de nós”. Colabora com a Revista Ideias. Para esta escreve contos e resenhas sobre arte, literatura e cinema.
Maria Célia Martirani, seu nome literário, é uma surpreendente escritora da atualidade. As suas obras nos surpreendem principalmente pela inovação e pelo inesperado de sua narrativa, sempre densa, poética e atual.
Seus textos são de difícil classificação quanto ao gênero. São contos, crônicas, prosa poética, tudo numa profusão que deixam sempre no leitor uma sensação de novidade, de inovação. Marcelo Franz fala, acertadamente, em “fina arte de narrar poemas e poetizar narrativas”. Esse talvez seja o ponto fulcral da obra de Maria Célia, como forma de se classificar seus textos: narrativas poéticas e poemas narrativos. Os textos são poéticos, líricos, mas podem também ser trágicos. Às vezes, as narrativas nos apresentam uma certa ingenuidade, mas, logo, em contraste, surgem outras percorridas por um fino e permanente erotismo.
Pode-se encontrar na obra de Maria Célia textos extremamente líricos, como são alguns poemas em prosa de sua autoria: No orquidário; ou poemas que se voltam à virtude infantil, como Arapuca de soltar passarinho; ou, então, este doce poema de amor: Romance. Há tantos outros, mas esses indicados ficam como exemplos.
Alguns textos narrativos, crônicas poéticas, lembram o estilo de Cecília Meireles, pela suavidade do tema e pelo lirismo, como este A uma borboleta; outros apresentam estrutura de conto ou próxima a essa forma literária, como este, uma espécie de conto inconcluso: Paulo – estação – liberdade; ou, mesmo, um conto trágico, como: Um dia, ele voltará. Outros textos são como células de possíveis romances: Pro-vocação. Há, ainda, textos a nos mostrarem a consciência de problemas sociais, como o último conto daquele conjunto de três, em que entram o filho, o pai e a mãe: Vem comigo, mãe!, ou este outro com características do Existencialismo: Natal; e para concluir esta exemplificação, um conto que encerra em si um forte caráter existencialista à Vergílio Ferreira: O acorde final.
Ao colocar por último o conto que dá título à obra, Para que as árvores não tombem de pé..., a autora cria uma espécie do que os Formalistas Russos convencionaram denominar estranhamento, o que confere a um texto o grau de literariedade. Para nós, simples leitores, o texto de Maria Célia Martirani nos leva a considerar como uma atitude literária inovadora. Rompe com o comum, com o normal. Note-se ainda que esse texto Para que as árvores não tombem de pé constitui um hino às árvores, em especial ao pinheiro. Nas palavras entrecortadas pelas pausas marcadas pelas vírgulas, a autora parece demonstrar o sentimento de perda daquela que é a árvore-símbolo. Desse conto, aqui se reproduzem, em homenagem à autora, as suas próprias palavras: “Quando, triste e belo, do alto, começou a cair, tombou inteiro, sério, despencando, com a mesma pose das madeiras que tombam de pé... Ao lado, compadecidos diante da brusca morte, curvam-se, frágeis e simples, os solidários bambus...”.
Uma obra poliforme, multívoca, como é a de Maria Célia não se resume a simples exemplos. Mesmo que é um risco o leitor apontar textos, talvez tirando o prazer da descoberta de outros leitores. Eu, antes de tudo, quis fazer uma leitura atenta de um livro que me tocou fundo pela beleza literária do texto.
Para exemplificar a narrativa curta de Maria Célia Martirani, selecionei por critério estritamente pessoal, dois textos: Dessacralização e A uma borboleta. Embora pequenos fragmentos, espero que dêem uma idéia do que seja o texto de Para que as árvores não tombem de pé.
1.dessacralizaçãoDespreocupados e livres, caminhavam, matutinos, as calçadas de qualquer domingo. Uma alegria bêbada, não de quem bebeu muito, mas se embriagou demais com a simples presença de um na vida do outro. Que não era simples, mas era o bastante, eles que só assim se bastavam, puros de ar, água e sol... Falavam e riam, em risos falados mansos, fadados que estavam apenas àquela miúda felicidade... Os passos dele largos, os dela curtos, ela que tentava a todo custo o acompanhar... Daí, a igreja... Entraram pela lateral... Entraram só por entrar... Não, não que quisessem assistir missa, melhor a igreja assim vazia, só os dois, só um pouquinho, só agradecer... Que será que agradeciam? A mão dele envolvendo toda a frágil mãozinha dela, ela que de tão pequena, quase nem batia na altura do ombro dele... Ele, que de tão alto, baixava generoso olhar pra encontrar o dela... Ajoelharam e apenas se deixaram ver por alguma imagem, algum santo, algum anjo voando solto no redondo da alta cúpula-vitral de luz. E foi com essa espécie de sabe-se lá que luz, que de lá logo saíram agora enlaçados, nos novos laços de fita de alguma esperança...
(De Para que as árvores não tombem de pé, p. 169)

2.a uma borboleta
Empresta-me tua frágil asa frágil, eu quero ter forças para voar. Quero apreender só levezas... Não suporto mais o centro dessa gravidade toda de cenho franzido. Não posso com o peso dos pés, nesses trilhos imantados de ferro.
Ensina-me a polinizar o azul, tocando as hastes-pati¬nhas na volúpia do infinito. Faz-me mamar gotículas bran¬cas, na flor de um copo de leite... Eu preciso chover arcos de cores na íris do céu, conferir, à densidade verde, um farfalhar de pétalas ágeis. Pois a monotonia imóvel dos sérios silêncios da floresta, só perde o medo mistério, quando tuas asas aquareladas pousam na barriga das folhas e as fazem rir alegres cócegas. E o universo saltita numa efusão jocosa, dá gargalhadas de luz, apenas porque o tocaste no abre-fecha ligeiro do leque sedoso de tua se¬dução.
(De Para que as árvores não tombem em pé, p.237.)

quinta-feira, 28 de julho de 2011

CASTRO, MINHA TERRA.

Todos nós que saímos da nossa terra natal, sempre temos o desejo de a ela um dia retornar, nem mesmo que seja na lembrança. É o mito do eterno retorno.
Eu, como muitos, sinto uma saudade muito grande da minha cidade. Trago de lá boas lembranças. São recordações de uma adolescência pobre de recursos materiais, mas rico de experiência, de vivência, de amizades, enfim, de tudo um pouco. Até mesmo das águas do Iapó, que eu transpunha várias vezes ao dia, a caminho do trabalho ou da escola.
Estudei, por último no Colégio Diocesano de Santa Cruz. De lá, não esqueço professores, como Bernardo Letzinger, João Baptista Cobbe, Nicolau Hampf, Lourival Leite de Carvalho e muitos outros.
Lembro também, e muito, dos colegas: Luiz Eduardo dos Santos, Georberto Flores, Jorge Alcy Jabczynski, e também das meninas. No começo eram várias: Josema Fiorrilo, Nanci Pereira, Neide Menarim, Perli Lopes, Salua Fadel. Mais tarde, o grupo se resumiu em apenas três. Com elas fomos até o final do curso Científico. Bons tempos aqueles dos anos de 1950. Tempos de sonhos, de voos da juventude, de esperanças, de projetos, que, alguns se realizaram, outros ficaram pelo caminho.
Sempre que para lá retorno, fico ao lado do velho prédio do antigo Cine Marajá. Que saudade das sessões de domingo, às 19 horas. Era lá que se viam muitas das meninas bonitas da cidade, como era também às margens do Iapó, nas areias, que, por isso, o local se chamava Areião.
Fica aqui a demonstração do meu amor por minha terra e da saudade que dela sinto. Saudade de um tempo, que, sem saber, eu fui feliz...