sexta-feira, 9 de abril de 2010

SOBRE O HAICAI

Em um ensaio sobre o hai-kai, o pensador e literato Octavio Paz escreve:
De um ponto de vista formal, o hai-kai divide-se em duas partes. Uma, da condição geral e da situação temporal e espacial do poema (outono ou primavera, meio-dia ou entardecer, uma árvore ou uma pedra, a lua ou um rouxinol); outra, relampejante, deve conter um elemento ativo. Uma descritiva e quase enunciativa; a outra, inesperada. A percepção poética surge do choque entre ambas. A índole mesma do hai-kai é favorável a um humor seco, nada sentimental, e aos jogos de palavras, onomatopéias e aliterações, recursos constantes de Bashô, como também de seus continuadores, Buson e Issa. Arte anti-intelectual, sempre concreta e anti-literária, o hai-kai é uma pequena cápsula carregada de poesia capaz de fazer saltar a realidade aparente. Um poema de Bashô - que tem resistido a todas as traduções e que dou aqui numa inepta versão - talvez esclareça o que quero dizer:

Sobre o tanque morto
um ruído de rã
submergindo.


Esse hai-kai de Bashô, mestre dos haicaístas japoneses, é considerado paradigma do pensamento e do modo de poetar dos nipônicos. Estudado, traduzido e adaptado por diferentes poetas, tem sido divulgado por ensaístas do mundo todo, atraídos que foram pela beleza do poema e pela sensação do inesperado que ele nos causa.



(Foto - SUELY SHIBA)

Seguem algumas traduções ou adaptações:

Inicialmente, apresenta-se o mais famoso hai-kai de Bashô, em tradução literal da língua japonesa pelo escritor, poeta e pensador mexicano, prêmio Nobel de Literatura, Octavio Paz. Aqui, o poema aparece em versão do espanhol para o português de Olga Savary:

Sobre o tanque morto
Um ruído de rã
Submergindo


Em seguida, publicam-se traduções ou adaptações de vários haicaístas, uns poetas famposos, outros meros curiosos, como eu próprio:

1.Tradução de Cecília Meirelles:

Velho tanque
Uma rã mergulha
Barulho da água

2.Tradução de Paulo Leminski:

Velha lagoa
o sapo salta
o som da água


3.Tradução de Olga Savary

Ah, o velho lago.
De repente a rã no ar
e o baque na água


4.Tradução de Décio Pignatari:

VELHA LAGOA
UMA RÃ MERGULHA
UMA RÃ ÁGUÁGUA


5.Tradução de Paulo Franchetti e Elza Dói:

O velho tanque
Uma rã mergulha,
Barulho de água


6.Tradução de Estrela Ruiz Leminski:

Chuá, chuá
coach, coach
tchibum!


7.Adaptação de Jayme Bueno (eu não saberia traduzir do original):

Sobre águas paradas
A rã paira no espaço
as patas geladas


8.Adaptação - Jayme Bueno (eu não saberia traduzir do original):

Suspensa no espaço
Plástica a rã sobre as águas
Busca o seu regaço

2 comentários:

Daniel Osiecki disse...

Olá, professor. Gostei muito do texto do Paz. Lembrei-me de um texto da Helena Kolody no qual ela falava de quando conheceu Paulo Leminski e teve algumas "aulas" sobre hai-kai com ele. Muito interessante. E nesse seu texto o senhor cita Leminski. Mudando um pouco de assunto, eu me lembro de um autor português que o senhor me indicou há algum tempo. Era um escritor muito jovem que era envolvido com música. Por acaso esse escritor é o José Luis Peixoto? Autor de Nenhum Olhar. Se for esse, estou lendo esse romance e gostando muito. Um grande abraço.

Jayme Ferreira Bueno disse...

Oi, Daniel,
Estive um pouco desaparecido do Blog, retornei agora e resolvi enfrentar o hai-kai. Helena Kolody possui alguns hai-kais e o Leminski é exímio haicaísta. É tradutor de Bashô e de outros. Buson e Issa foram fiéis seguidores do mestre Bashô. Outra divulgadora do hai-kai no Brasil é Olga Savary. Porém, quem limou muito o hai-kai e o tornou bastante complexo pelas regras que impôs à forma, foi Guilherme de Almeida.
Quanto ao poeta português a que me referi naquela época é de fato:
JOSÉ LUÍS PEIXOTO, que nasceu em 1974 em Galveias (Portalegre, Alentejo). Licenciou-se em Línguas e Literaturas Modernas pela Universidade Nova de Lisboa.
Em 2000, estreou com a pequena ficção Morreste-me (Prémio Jovens Criadores 97). Nesse mesmo ano, publicou o romance Nenhum Olhar (Prémio José Saramago 2001). Publicou ainda A Criança em Ruínas (poesia, 2001), Uma Casa na Escuridão (romance, 2002), A Casa, a Escuridão (poesia, 2002), Antídoto (prosa, 2003) e Cemitério de Pianos (prosa, 2006).
Tem textos publicados em revistas portuguesas e estrangeiras, inclusive com colunas permanentes.
Vou enviar por e-mail para você um arquivo com mais infpormações sobre ele.
Um grande abraço,
Jayme