sábado, 19 de dezembro de 2009

CRISTOVÃO TEZZA - UMA CRÔNICA: ZELIG À BRASILEIRA

1. Cristovão Tezza

Cristovão Tezza, o professor, o intelectual.
Tezza, o preocupado torcedor do Clube Atlético Paranaense

O paranense nascido em Santa Catarina, é, hoje, um dos grandes escritores brasileiros e inclusive reconhecido no mundo, principalmente depois de ter suas obras traduzidas e publicadas em vários países da Europa. Personalidade versátil e bastante jovem, já foi um pouco de tudo na vida: ator de teatro; aluno da Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante; relojoeiro; viajante meio clandestino pela Europa depois de não poder seguir o curso de Letras em Coimbra pelo acontecimento histórico português, a Revolução dos Cravos, de 25 de abril de 1974; Professor de Língua Portuguesa na Unaiversidade Federal de Santa Catarina; depois, professor na Universidade Federal do Paraná.
Desta última, recentemente solicitou demissão como nos conta na crônica Adeus às Aulas:
"Se é verdade que um bom texto é aquele capaz de transformar a vida, acabo de escrever uma obra-prima. Quem me conhece sabe que não sou de alardear minhas poucas e ralas qualidades, mas dessa vez não resisto ao impulso cabotino. Pois as cinco linhas que redigi, enxutas e precisas, atentas à força da tradição e com um toque tranquilo de modernidade, têm (modéstia à parte) essa perfeição transformadora. Em suma: pedi demissão da Universidade em que dou aulas há 24 anos. O requerimento ganhará alguns carimbos, duas ou três rubricas, rolará pelos escaninhos e em breve estarei livre co­­mo um pássaro".
Como escritor, é ensaísta, co-autor de livros didáticos, poeta, contista, romancista. Depois dos quatro livros iniciais, começou a ser conhecido nacionalmente com o romance Trapo, de 1988. Desde então destaca-se como grande romancista, principalmente com O Filho Eterno, de 2007. Foi com este livro que Tezza alcançou dimensão verdadeiramente internacional. A obra foi publicada em Portugal, na França, Itália, Holanda e na Espanha, em língua catalã. Em breve, o romance sairá na Austrália e na Nova Zelândia.
É um grande colecionador de Prêmios: Prêmio Petrobrás de Literatura, 1989, com Aventuras Provisórias; Prêmio Machado de Assis da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro (melhor romance do ano), 1998, com Breve Espaço entre a Cor e a Sombra; Prêmio da Academia Brasileira de Letras de melhor romance do ano e o Prêmio Bravo! de melhor obra, 2004, com O Fotógrafo. Com o último romance O Filho Eterno, recebeu: Prêmio da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte) de melhor obra de ficção do ano; em 2008, recebeu os prêmios Jabuti de melhor romance e o Prêmio Bravo! de melhor obra; Prêmio Portugal-Telecom de Literatura em Língua Portuguesa (1.º lugar) e Prêmio São Paulo de Literatura, melhor livro do ano; em 2009,recebeu o prêmio Zaffari & Bourbon, da Jornada Literária de Passo Fundo, como o melhor livro dos últimos dois anos.
É autor de textos, principalmente crônicas, para vários periódicos: revista Veja; jornal Folha de S.Paulo; Caderno Ilustrado, da mesma Folha de S. Paulo; e O Estado de São Paulo. Como um dos cronistas do jornal Gazeta do Povo, de Curitiba, tem publicado semanalmente crônicas fundamentais para o jornalismo e para a literatura.
Concluindo esta breve notícia sobre o homem, o escritor e o ex - mas eterno professor - Cristovão Tezza, reproduzo o comentário da blogueira Camila Batista, também atleticana, como se confessa: "Io sono atleticana, insegnante d'inglese, correttore di bozze e persona normale nel mio tempo libero": "Quem foi aluno do Tezza, foi; quem não foi não será mais: - 15th Dec, 2009", o que será uma grande pena! Mas, com certeza, perde-se, formalmente, um professor do ensino superior, mas, com certeza, ganha-se um escritor ainda maior e, assim, eterno professor de literatura e de vida.

2. Uma crônica: Zelig à Brasileira
Lula me lembra Zelig, o hilariante personagem do filme homônimo de Woody Allen, que vai se transformando fisicamente diante dos outros, para ficar parecido com eles. Como no “documentário” sobre Zelig, o tempo todo vemos nosso herói sorrindo com Obama na Casa Branca, falando sério em Copenhague, altissonante no Mercosul, companheiro na Bolívia, nobre em Buckingham, comunista em Cuba, católico no Vaticano e por aí vai. Segundo a tradição miscigenante da cultura brasileira, Lula, como Zelig, transforma-se camaleônico no que for preciso de modo a ficar sempre no mesmo lugar – é uma “metamorfose ambulante”, como ele mesmo se definiu. Na lógica astuta do país, tudo se rege por um senso perpétuo de amortecimento de conflitos e adequação biológica ao meio ambiente.
Seu governo é a expressão de nada; o herói carismático vê-se carregado nos ombros da mais azeitada e obediente máquina partidária do Brasil moderno, que funde um projeto messiânico-revolucionário com a burocracia democrática colocada a seu serviço, a cada dia mais esvaziada politicamente. A única ideologia que resta é uma política externa esfarrapada que dá tapinhas nas costas de Ahmadinejad e ruge furioso contra a eleição de Honduras, que poderia, pela simples força do bom-senso, recolocá-la nos trilhos; que devolve em poucas horas à ditadura cubana dois atletas fugitivos e resiste tenazmente a extraditar para a Itália alguém condenado por crimes comuns num Estado de Direito. Fala em “pragmatismo” e perde todas as eleições em que se mete nos fóruns internacionais, enquanto ri na fotografia.
O imenso Brasil popular que veio à tona por força do Plano Real e do otimismo econômico dos anos 90 parece ter encontrado em Zelig o seu mantra político-religioso. O que fazer com o povo brasileiro que, súbito, está nas ruas, de celular na mão direita e tacape na esquerda? Nada a estranhar nos maços de dinheiro enfiados em cuecas e bolsos do DEM e do PT, abençoados por rezas compungidas de ladrões sinceros – como Lula se apressou a dizer, são cenas “que não falam por si”. Afinal, o país de maior mobilidade social do mundo é também o único em que um deputado fraudando um painel de um Congresso Nacional vai se tornar em pouco tempo, inocente, governador do Distrito Federal.
Nada melhorou em nenhuma área. A educação básica patina nos seus piores índices de sempre – enquanto abrem-se dezenas de universidades federais prontas a ocupar o rabagésimo lugar de relevância sob qualquer critério. A lógica que nos arrasta é a da mendicância e a do pátio dos milagres – empresários mendigos, políticos mendigos e povo mendigo, esperando de boca aberta e mão espalmada o sorriso de Silvio Santos a jogar dinheiro na plateia. Faltava um bom ator para o papel – o próprio Silvio Santos até que tentou, mas levou uma rasteira jurídica mais esperta ainda na alvorada de Collor. Agora, Lula é o cara.
(Gazeta do Povo, 15/12/09, p. 3 - contato@cristovaotezza.com.br)

3. Comentário
Comentar é totalmente desnecessário. Aí está um retrato vivo do que vivemos. Temos um líder mundial, "o cara"!... mas quem ganha o Prêmio Nobel da Paz é outro, "the man"!... temos um defensor do meio ambiente... que exige sejam as despesas pagas pelos outros países, como se mandasse no mundo! (chega a lembrar Carlitos, em O Grande Ditador, a dar piparotes em um grande balão com o mapa-mundi); antes, tínhamos exames - ENC, ENEM - exemplos para o mundo em termos de avaliação educacional, hoje esses exames são fraudados, anulados, desprezados por alunos e universidades, tudo por incompetência de técnicos elevados a altos cargos por força da Carteirinha do PT.
Diz-se popularmente que "não se deve dar o peixe, mas ensinar a pescar". O povo brasileiro jamais será pescador! Para quê? Recebe as mais estranhas bolsas para não ter que trabalhar, nem mandar seus filhos à escola. Estudar? Com que finalidade, se há outros critérios para ingressar em uma Universidade, que não é o da competência? E para vencer na vida?
O Silvio Santos com suas histrionices - histrionice, no sentido original do termo - é mais correto no proceder. Distribui dinheiro claramente à frente das câmeras da sua rede de TV criada e mantida pelo tino comercial do eterno camelô que foi e que deseja continuar a ser. Sorri satisfeito pela migalha que distribui a quem vai até a um auditório em procura do pequeno óbulo. E o que dizer do governante que só repete que "não sabe de nada"?
Parabéns, Tezza, por cumprir com sua arte a função social de formador de opinião! Abrir os olhos do povo é preciso! Viver nas trevas da ignorância não é preciso! (Homenagem a navegadores antigos e a Fernando Pessoa).

2 comentários:

L. Rafael Nolli disse...

Muito interessante os 100 essenciais de nossa literatura.

Jayme Ferreira Bueno disse...

Prezado Professor L. Rafael Nolli,
Primeiramente, obrigado pelo seu comentário. Continuaremos a publicar um pouco de literatura com alguma frequencia neste espaço.
Vendo os livros e os autores que prefere, percebi que muitos deles coincidem com os meus prediletos, como já deixei escrito por algumas das postagens. Assim acontece com Dom Quixote, As Flores do Mal, e Sagarana.
Quanto aos autores, de Drummond gosto de toda a poesia, mas talvez um pouco menos de A Rosa do Povo, o que não invalida o grande atrativo que exerce sobre nós toda a sua produção poética; De Umberto Eco, ainda considero a grande obra uma das primeiras, Obra Aberta; De Clarice, também gosto dos primeiros, Perto do Coração Selvagem e A Paixão Segundo G.H., além dos contos de Felicidade Clandestina; e, por último, sobre Saramago, considero grande autor, mas ainda prefiro Levantado do Chão, Memorial do Convento, O Ano da Morte de Ricardo Reis e A Jangada de Pedra. Lendo agora o último livro, confesso que estou gostando bastante de Caim.
Um grande abraço,
Jayme