sexta-feira, 19 de abril de 2013

O VELHO TREM DE FERRO

Ditosos a quem acena
Um lenço de despedida!
São felizes: têm pena...

Eu sofro sem pena a vida.

 Doo-me até onde penso,
E a dor é já de pensar,
Órfão de um sonho suspenso

Pela maré a vazar...

 E sobe até mim, já farto
De improfícuas agonias,
No cais de onde nunca parto,
A maresia dos dias.
 
(Poema Marinha. PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1969, p. 147.)

      Castro não tem mar. Castro não tem porto, aliás, tem, mas é portinho onde não atracam navios, atracam pequenas canoas de algum pescador descuidado. O lugar que se chama Porto fica na margem direita do rio. Mas aquele espaço era como um refúgio para algum esporte. Houve época que ali as jovens de Castro tentavam jogar vôlei. Quando elas lá não estavam, éramos nós, os meninos, que ali íamos jogar o que deveria ser uma espécie de futebol.
Portanto, ali, no Porto, não havia despedida com lenço branco acenando. Mas havia a velha estação da estrada de ferro. Era ali que se aguardava o velho trem na espera de chegar com ele alguma ilusão. Era ali que havia despedidas, algumas pungentes, de cortar o coração, mas não se acenavam lenços brancos.
O velho trem vinha de longe, de São Paulo, chegava cansado. Resfolegava. Depois de passar por Jaguariaíva e de uma breve parada em Piraí do Sul, os trilhos margeavam o tortuoso Iapó. E o trem acompanhava. Já nas fraldas da cidade de Castro, o velho trem apitava. Primeiro cruzava uma pequena estrada de terra, depois apitava novamente para cruzar uma rua e entrar na ponte de grande estrutura metálica. Estava cruzando o Iapó. Margeava a várzea por uma reta e um chão plano, antes de fazer acentuada curva à esquerda, para novamente apitar. Antes de dobrar ligeiramente à direita e cruzar outra rua, esta já bem mais movimentada, o trem afinal apitava contente, estava ingressando no quadro da estação. As agulhas afastavam ou uniam trilhos, para que ele pudesse, finalmente, encostar na plataforma.
Aguardavam-se pessoas. Umas vinham, outras não. O trem como sedento necessitava de água para suas caldeiras. O carvão já estava sendo colocado nas fornalhas. Para a água, do alto da caixa d’água, lá estava o velho Gustavo. Ele era o dono daquele espaço. Ali, só ele, mais ninguém. As longas mangueiras de pano desciam até a máquina e ali depositava a água que iria refrescar, mas também movimentar o pesado trem. E ele partia, apitando. Seguiria em direção de novos destinos: Curitiba, Rio Grande do Sul. Dependia... O fato é que deixava um vazio na velha estação. Castro voltaria a dormir o sono de cidade pequena e abandonada.   

 

3 comentários:

Catia Toledo disse...

Que texto carregado de emoção, construída na memória e no coração...

Jorge Ramiro disse...

Eu gosto muito de escrever e por isso tenho de estar focado. É importante para o homem e os animais têr vitaminas. Então eu compro Vetnil para meu cão Vetnil.

Jayme Ferreira Bueno disse...

Apesar de haver passado tanto tempo, obrigado a vocês que comentaram a minha postagem.
Grande abraço, Jayme.